Não coloco nome nas minhas coisas.
Elas são o que já existem.
Um telefone público verde,
azul e branco encostado em ferro
amarelo.
Fechadura, é um nome que pertence a ela.
Cadeira de balanço, árvore de natal, xícara
de café, cheia de leite até a boca, bola de bosta
de gato.
Flip de front pulando uma imensa corrente,
sexta-feira,três e meia da madrugada. Aplauso,
suor escorrendo da canela. Nada, absolutamente,
foi invenção minha.
Faço uso de apropriações. Meu nome, por exemplo.
reconhecimento é identificar sua sombra na calçada em meio aos pombos.

aquele pedaço
de ferro e madeira
- semelhante as que
seguram as telhas acima
de nossas cabeças -
pintados de azul
são completamente inteiros.
lhe deram uma cor,
um amassado bem ao lado
de uma divisa, enfiaram-lhe
pregos e parafusos, que
por dentro são marrons
ou possuem cor de enferrujo,
mas, na parte que se é mostrada
a quem passeia pelo calçada de
pedras, é azul.
naquele pedaço cabe uma sala
mobilhada, com sofá, cortinas
cor de ciranda,
um mosquito com apenas uma asa,
um domingo seis horas da tarde,
uma pinta preta no cotovelo,
dois dedinhos menores nos pés,
uma bochecha estufadinha abaixo dos olhos,
e um beijo na sua tez.
aquele pedaço, completamente inteiro,
é um poema com você no meio.
quisera eu ter nascido diferente
acoplado a um vaso improvisado
em uma lata de tinta acrílica
abaixo de uma samambaia e ao lado
de uma parede pintada de cinza.
quisera eu ter raízes presas
soterradas pela vital mistura
de umas boas mãos de terra
e uma quantidade generosa de merda.
ficar acima somente dos azuleijos
com seus enormes rejuntes negros
e não ter o fundo do vaso furado
evitando que chegue até mim
quem se encontra mais abaixo
ou quem sabe servir de enfeite
para jazigos, pintando de verde
carne sem vida com uma importância
afetiva muito maior que as minhas
fotossínteses mal sucedidas.